A 7 de junho de 2019 decorreu a Assembleia Geral Ordinária do Sport Lisboa e Benfica para votação do orçamento e plano de atividades do Clube para 2019/20. Aproveitei a minha presença naquele que é momento mais importante de um associado para fazer uma breve declaração sobre o que é o Benfica para mim. Podem ler o texto aqui. O título talvez pareça presunçoso mas é sincero. E é também por isso que volto a usá-lo hoje. Releio as minhas últimas palavras "O Benfica é uno e é múltiplo, é singular e é diversidade, é liberdade de expressão e de que questionar. Nunca se esqueçam, o Benfica é nosso e faz-se de todos. Da opinião de todos" e tento compreender o que terá acontecido nos últimos meses para que a relação entre consócios esteja tão extremada.
Quando olhamos para trás e pensamos nos irmãos Dassler, nos Gallagher, em Caim e Abel e em tantos outros casos - deixo apenas as gémeas de Olhos de Água de fora porque há mínimos numa conversa séria -, as explicações para familiares dividirem-se são muitas. Da ganância ao ciúme, da soberba à inveja, assim se estragam relações duradouras e que julgávamos à prova de tudo. Para muitos de nós, um clube é, ou deveria ser, uma grande família. Porém, esse conceito traz em si uma enorme responsabilidade: somos obrigados a aceitar a diferença e isso é algo complicado. Diria até que é quase impossível.
Vivemos numa era de enganosas ofertas feitas à medida de cada um, pelo que somos levados a acreditar que não precisamos de adaptar-nos. Do pacote de Internet móvel ao menu de fast-food, do partido político ao programa de uma campanha, do Tinder ao speed dating, queremos tudo à nossa medida. E não aceitamos que os outros sejam menos do que 100% iguais ao nosso melhor sonho. Só que o mundo da Disney não existe. E a desilusão está sempre ao virar da esquina. Se queremos mais e melhor, temos de lutar por isso. Temos de dar e receber. De aprender e ensinar. De conhecer e reconhecer. Temos de fazer. E para melhorar também é preciso ceder.
Diz-se que Júlio César terá sido o primeiro político a pôr em prática o conceito "Dividir para reinar (divide et impera), e talvez seja. Mas, pelo menos, é indiscutível que a ideia tem sido replicada ao longo dos séculos. Em regimes mais ou menos autocráticos, a ação política contra a oposição divide-se entre: ter os inimigos por perto; dividir para reinar; arregimentar-se contra um inimigo externo. Pensem em partidos políticos, em dirigentes desportivos ou chefias menos democráticas e verão que estas medidas repetem-se. Ninguém vai reinventar a roda, basta fazer o que sempre foi feito.
Volto aquela noite de junho do ano passado: "O Benfica é feito por nós aqui, na Assembleia. E é feito no Estádio da Luz, nos outros estádios, nas roulottes, nas viagens, na casa dos avós, dos primos e dos tios, ou no jogo de bola na nossa rua." O peso da expressão "de muitos, um" obriga a que compreendamos e ajamos segundo um dos princípios mais complicados de todos: aceitar a diferença. E isso é fundamental nas eleições que estão aí a chegar. Falta pouco tempo e, porém, ainda falta demasiado. Os insultos, as acusações, as mentiras e as vendetas não podem triunfar. Por muito que queiramos defender a nossa visão do Benfica, não podemos desprezar o nosso camarada. O que se pede aos benfiquistas é algo que não é novo mas que parece esquecido por muitos: elevação no debate interno. Se ousarmos esquecermo-nos de que há uma manhã seguinte à votação, corremos o risco de acordar num dia bem mais negro, vivendo num clube estilhaçado. Tal como um partido ou uma família, um clube deve ter diferentes olhares. Nada é pior do que a unanimidade vazia e estéril. Todavia, não devemos deixar que a polifonia dos benfiquistas se sobreponha a um ideal superior. Não podemos esquecer-nos de que haverá um dia depois das eleições. Que haverá derrotados mas que só queremos ter um vencedor: o Sport Lisboa e Benfica.
ps: obrigado pelo sticker, Aires.
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